sexta-feira, 30 de junho de 2023

A história da professora AFONSINA - VIII -




                                         Praias do rio Trombetas - imagem da Internet -

Francisco, ao se casar com a filha mais nova de uma das figuras preeminentes da cidade, passou, como é natural, a frequentar os círculos mais altos da sociedade local. Não tardou muito para fazer uma sólida e sincera amizade com o Médico, Dr. Bruzza, marido da minha tia Mary.  
Enquanto a amizade dos dois se solidificava a ponto de tornarem-se confidentes, lá na Capital, sem meios de saber notícias atuais da filha, D. Carmem ( sua mãe e minha avó materna ), resolveu que deveria ir pessoalmente visitar a primogênita. Tempos depois, eis que chega ao porto de Oriximiná o " vapor " Barão de Cametá ", trazendo entre seus passageiros a mamãe saudosa, que tinha a intenção de voltar à Belém pelo mesmo navio, o que demoraria cerca de doze dias, entre sua chegada à Manaus e seu regresso até Oriximiná. Tratou então de aproveitar a companhia da filha e do genro, o máximo de tempo possível. As novidades da Capital, foram exaustivamente descritas pela mamãe Carmem, enquanto a Maria Rita contava-lhe detalhes de sua nova vida no interior, ora narrando episódios engraçados ora, com o olhar perdido em pensamentos, querendo saber como estavam os amigos e vizinhos, lá em Belém...
É necessário, a esta altura da narrativa, passar para os leitores mais jovens, preceitos e normas -  inimagináveis para os dias de hoje - que vigoravam naquela época. Um deles, que tinha a concordância tácita de toda a sociedade, era que, quando dois ou mais homens estivessem conversando, nenhuma mulher, criança e muito menos serviçal, poderia se aproximar, salvo se fosse expressamente chamado ou chamada. Fora isto, deveriam passar ao largo!
 Um belo dia, porém, MARIA RITA casualmente ouviu, ao passar pela porta da sala, o FRANCISCO fazendo um comentário em sua conversa com o dr. BRUZZA, no qual se queixava de ter ficado viúvo, com um filho de apenas 5 anos de idade e que precisava voltar a se casar. Na cidade porém, todas as moças em idade de casar e que lhe despertavam algum interesse, já eram casadas ou estavam comprometidas. Ao ouvir tal confidência, MARIA RITA, atrevida, irrompeu na sala, aproximou-se dos dois e, de maneira inesperada, disse: " Seu CHICO, a mamãe voltará  à Belém e vai trazer minha irmã mais nova pra casar com o senhor! ". Estáticos, não só pelo inusitado da declaração mas principalmente pela  " intromissão absurda " de uma mulher na conversa de dois homens, nada foi dito de pronto por nenhum deles. Apenas fizeram um muxoxo que acabou sendo interpretado por ela como aquiescência. Alguns dias se passaram até que o " Barão de Cametá ", voltando de Manaus, atracou no  " trapiche "*, desembarcando viajantes e mercadorias e embarcando passageiros e cargas - principalmente castanha do Pará e juta - e, entre os passageiros, lá se foi D. Carmem de volta à capital paraense cumprir as " determinações " da sua enérgica e resoluta filha mais velha...


* TRAPICHE - Ponte ( no caso, de madeira ) localizada à margem do rio, em frente à cidade, construída na parte mais profunda do rio, que serve para a atracação de navios e outros barcos, à exceção de transatlânticos que carecem de maior calado. Estes, fundeavam no canal existente no meio do rio, lançando suas enormes âncoras, presas a correntes de diâmetro impressionante, para nós, meninos de imaginação fértil, " da grossura da nossa coxa "...
                                                               

Continua na próxima sexta-feira...
Bom fim de semana a todos.



Clóvis de Guarajuba
ONG Ande&Limpe

Um comentário:

Anônimo disse...

Antigamente às mulheres não tinham direitos a quem desposar. E assim foi com meus avós e pais.